domingo, 20 de fevereiro de 2011

Costumo ter medo de Bicho Papão

 Estava com medo. Muito medo. Não fazia ideia do que estaria por vir. Ao entrar pelo portão principal, perguntei ao porteiro onde seria o tal prédio o qual haviam me chamado e, também, perguntei pelo banheiro. Gentilmente ele me explicou e me alcançou uma chave de acesso ao banheiro feminino.
Tranquei por dentro, me olhei no espelho e percebi que estava em pânico. Fiz o número um, lavei as mãos e continuei a me olhar no espelho procurando possíveis imperfeições e/ou uma aparência sem credibilidade.  Estava ficando paranóica. Disquei alguns muitos números de amigos e para catástrofe do momento – em plena 9h45min – todos estavam ocupados, deduzi quando não atenderam e outras fora de área. Precisava falar com alguém. Por sorte, pelo menos um atendeu, mas não manifestou o menor estimulo. Porém, estava mais calma.
Já havia saído do banheiro – e devolvido a chave – e me encaminhava para a escada de acesso ao segundo andar. Suava, suava muito. Meu celular estava com a tela molhada, tamanha tensão ao usá-lo.  A moça que atendeu dirigiu-me para a “terceira porta a direita”. Não deduzi que fosse muito esperta. A porta certa era a quarta – ela havia contando após a sala dela que seria a número um para um leigo ao prédio.
A moça com que eu deveria falar reconheceu-me quando disse meu nome e foi simpática. Pediu para eu aguardar o “SECRETÁRIO”.  Aguardar por si só já é algo muito tenso para alguém hiperativo feito eu, quem dirá me informar que eu aguardava uma das autoridades maiores do “negócio” para a conversa que ela marcará. Não, eu não sabia que seria com ele. Pelo nome lembrei que ele era meu seguidor no twitter e eu o seguia também. Era um torcedor do tricolor e bastante ativo nos comentários – lembrei.
A espera deve ter durado alguns minutos, não sei ao certo, mas para mim foi uma eternidade. Nestes “eternos” minutos repensei toda minha vida e conclui que tenho medo das pessoas até então desconhecidas. Elas parecem fortes, robustas e como numa selva, vale a lei do maior comer o menor e eu me sinto o bichinho aniquilado. Na verdade, esse medo passa, assim que consto que são apenas pessoas comuns, como eu. Que não irão me morder e nem sequer conseguem ler meu pensamento quanto a elas (UFA).
O senhor que aparece no corredor parece passar pelo mesmo desconforto. Esse, porém, de traje formal, mala nas mãos e postura firme e precisa comete o mesmo equivoco com a porta, após a informação errada. Detalhista que sou e com a conseqüência dos episódios da série Lie to me* percebi que ele suava e estava tão, ou mais, nervoso que eu. Antes de aparecer à porta ele respirou fundo, arrumou o colarinho da blusa, se postou em frente da porta e deu um passo atrás. Um gesto bastante inseguro para o senhor maduro que ele aparentava ser. Disfarçando o nervosismo, cumprimentou a moça que o atendeu com uma voz cordial e atenta. Se saiu bem, mas eu notei seu medo. Isso me fez perceber que sempre haverá o medo, independente da experiência que se tenha. Como já citará William Bonner, mesmo depois de anos, haverá o “friozinho na barriga” a cada novo telejornal.
Acabou espera. O Secretário chamou por mim. Postei-me em sua frente, mas não tive a mesma máscara do senhor nervoso antes de mim. Deixei meu casaco cair, sentei-me toda atrapalhada e ele deve ter notado que eu estava gelada e suando. Em poucos detalhes, além dos que eu já sabia a seu respeito, notei também que ele era petista – havia uma moldura do Lula como presidente em seu escritório.
Para não estender o conversa em detalhes por menores, o tal “bicho papão” era um senhor, ou melhor um jovem - entre 30 e 40 anos – de boa aparência, gentil e me fez sentir a altura dele. Me surpreendeu e saí de lá com mais do que chegará. Saí com oportunidade, com o voto de confiança, com algo que a tempo eu sonhava. Há anos que eu tentava, e, aquela, mera pessoa que eu acabará de conhecer me concedeu. Foi minha primeira entrevista de emprego. Mais uma barreira rompida. Nunca existiu o bicho papão...

*Seriado americano que mostra uma equipe de especialistas em solucionar casos através de micro expressões.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Quando perdi minha inocência

* O primeiro texto da série "Minha querida Infância". P.S. Todos serão história verídicas.
 
Tinha pouco mais de quatro anos e uma curiosidade tremenda. Era verão e um aglomerado de homens surgia diante dos meus olhos. Meu primo, 8 anos mais velho que eu, havia chegado com algo que me seduzira a primeira vista. Gibis.
A paixão por revistas, livros e jornais é algo que carrego comigo desde bem pequena, talvez uma previsão do que viria a ser minha profissão. Naquela manhã, ou tarde - não lembro ao certo - ele chegará com dois. Um deles estilo faroeste – se não me falha a memória, TEX.  O outro era diferente de todos que já tinha visto, era colorido e tinha pessoas. De imediato pensei que eram para mim. Para minha decepção ele exibira aquele aglomerado de páginas coloridas para todos os homens ali presentes – meu pai e os demais dos quais não recordo quem seriam – menos para mim.
Mimada que era fiz cara de choro e exigi ver também. Disse-me que era revista de menino e me entregou o outro gibi, do qual eu julgava da pior espécie. Era sem vida, com poucas cores e eu queria o outro. Indignada fiquei de birra e sai dali.
 Mas não haveria de terminar ali. Com que ele achava que estava se metendo? “Revista de menino”? Ora bolas, eu sempre gostei de brinquedos de menino, carrinhos e bola, como ele poderia pensar que eu não gostaria daquele livrinho tão colorido? Já na época, era contra esses preconceitos machistas e pré-estipulados pela sociedade.
Aquela revista haveria de ser minha. Escondi-me próximo do local e fiquei no aguardo de qualquer passo em falso do inimigo. Minha mãe, mesmo sem saber, foi minha cúmplice, chamando todos para o café. Eles estavam no galpão e teriam que se deslocar até a cozinha, na minha casa. Vi de canto que ele soltara meu “tesouro” em cima de uma "pia" de fumo, com mais ou menos o dobro da minha altura (nunca fui muito alta).
Sorrateiramente peguei um banco que havia lá e o usei para subir. Ainda assim era alto e tive que dar impulso para conseguir alcançar o alto. Por pouco não fui para o chão. Ao sentar-me naquela "pia" de fumo tão alta e com aquele gibi em minhas mãos, me senti tão grande, forte e corajosa que nada do mundo me atrapalhara – nem aqueles tocos de fumo que costumavam pinicar a bunda.
Em êxtase e com o coração a mil eu analisará o tal gibi. Havia vencido. Curiosa, o abri e em espanto fiquei. Era uma moça loira bastante bonita e um cara forte de pele morena e eles faziam coisas que não posso relatar para o horário.  Era um gibi pornô, daqueles que fazia sucesso nos anos 80. Sem entender aquilo tudo, e julgando muito nojento o “pirulito” que ela tinha na boca, controlei o choro de susto e sai imediatamente dali.
Não contei o episódio a ninguém, provavelmente apanharia. Estava triunfante e assustada ao mesmo tempo. Havia perdido minha inocência.

Minha querida infância

Viviane Moura aos 2 anos: tentando perder o medo do triciclo
Bons tempos aqueles em que não precisava me preocupar com o tempo. Que doce não engordava e pão com melado era sagrado. As contas e as responsabilidades eram coisas de adultos. Nosso único compromisso era com a liberdade de ser criança. Tempo de brincar, deitar e rolar. A vida parecia, que nem passaria. Mas passou. Ah minha querida infância. Minhas birras, meus dengos e aqueles muitos planos para o futuro, de quem queria ter todos os brinquedos do mundo. Sei que pode parecer clichê, mas quem não tem saudade daquela infância? Daquele tempo em que banho de chuva era mágico e a criminalidade era coisa distante. Diferente de hoje, com uma memória recente péssima - talvez devido à acomodação do meu cérebro na rotina rodeada de tecnologia - do meu passado eu muito recordo. Foi tão incrível. Fui à heroína da minha própria história em quadrinhos e hoje quero relatar o máximo que posso.
Pensando nisso resolvi criar a “Minha querida infância”, uma série de textos que ironizam assuntos polêmicos de hoje para contar as simples e inesquecíveis histórias que vivemos na fase mais colorida.

 

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